O Itamaraty está correto ao não comentar o caso Navalny



Era previsível. Assim que Navalny faleceu, começaram as cobranças raivosas para que o Itamaraty e Lula se juntassem ao coro de acusações contra Putin.

Obviamente, os EUA e os países europeus (o chamado Ocidente) não pestanejaram em acusar imediatamente Putin de “assassinato”. O Sul Global, contudo, preferiu ter um mínimo de cautela e aguardar os acontecimentos decantarem.

É o caso do Brasil. O Itamaraty não saiu correndo para acusar Putin, como exige, praticamente aos berros, boa parte da nossa mídia.

Ora, acusar o presidente russo é fácil, mas resulta difícil identificar o que Putin e seu governo teriam a ganhar, agora, com a morte de Navalny.

Ao contrário, podem ser identificados grandes e claros prejuízos. Putin estava fazendo esforços para divulgar sua “narrativa” para o público ocidental. Deu a já famosa entrevista para Tucker Carlson, fez declarações elogiosas a Trump, de olho nos eleitores republicanos, emitiu sinais de que gostaria de negociar, de novo, a paz etc. Contudo, a morte de Navalny já eclipsou todo esse esforço.
Navalny estava preso e isolado. Pouco ou nada podia fazer, nessas circunstâncias, contra Putin. Notícias sobre ele, mesmo no Ocidente, eram esparsas. Se estivesse solto, na Rússia ou na Alemanha, seria outra história.
Navalny, ao contrário do que a imprensa ocidental diz, não é muito popular na Rússia. Quando foi candidato a prefeito de Moscou, teve 27% dos votos. Segundo pesquisa de opinião feita, em 2021, pelo Levada Center, apenas 19% dos russos aprovavam o trabalho de Navalny. Navalny, que chamou a chamar chechenos e georgianos de “ratos”, já fez o jogo da xenofobia para tentar se popularizar. Mudou depois para adaptar-se à imagem que o Ocidente exigia. Passou a tratar fundamentalmente de “corrupção”, estratagema geopolítico que conhecemos muito bem.
Ademais, a morte de Navalny, às vésperas da eleição russa, causa ruído indesejado num pleito que Putin ganharia com facilidade.
A morte de Navalny poderá facilitar a aprovação da nova ajuda dos EUA à Ucrânia, que ainda está parada na House of Representatives.
A exploração da morte de Navalny deverá aumentar também o apoio às ações da Otan na Ucrânia, num momento em que a popularidade dessa guerra estava decaindo rapidamente, tanto no EUA quanto na Europa.
A morte de Navalny poderá fortalecer Zelensky, numa conjuntura em que crescia bastante a desconfiança sobre a sua competência e a lisura de seu governo.

Enfim, sob quaisquer ângulos, internos e externos, a morte de Navalny é, objetivamente, algo inútil e negativo para Putin.

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