Atualização, às 18:53

O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro afirma que o presidente Jair Bolsonaro e o ex-mandatário Luiz Inácio Lula da Silva representam dois extremos a se evitar no Brasil, embora o ex-juiz tenha afirmado, em entrevista à AFP, que não pensa nas eleições de 2022. Moro, de 47 anos, renunciou à magistratura em 2019, para se tornar ministro de Bolsonaro e dar continuidade à cruzada contra a corrupção iniciada com a Operação Lava Jato. Em abril, deixou o governo, acusando Bolsonaro de tentar interferir em investigações da Polícia Federal. Hoje, o presidente o chama de traidor e Lula, de canalha. Seguem abaixo os principais trechos da entrevista, realizada remotamente nesta segunda-feira:
P: Após as suas acusações contra Bolsonaro, o senhor se sente parcialmente responsável pela crise política no país?
R: Minha intenção não foi prejudicar o governo, foi, especialmente, esclarecer por que eu estava saindo (
) Após o início da pandemia, começou a haver uma certa crise de credibilidade do governo, na minha opinião, e uma tensão crescente com os outros poderes: o Supremo Tribunal Federal e o Congresso. Minha saída entra nesse contexto, mas é apenas uma parte, não me sinto responsável (pela crise).
P: O presidente quebrou a promessa de combater a corrupção?
R: Quando eu estava no ministério, conseguimos avançar principalmente no combate à criminalidade violenta e ao crime organizado, mas em relação à corrupção, não tanto. Um dos problemas, na minha opinião e com todo o respeito foi uma falta de apoio maior da parte do Palácio do Planalto.
P: O senhor acredita na postura recente de Bolsonaro, mais moderada?
R: Essa mudança de postura do presidente nas últimas semanas, reduzindo a hostilidade e adotando um discurso mais moderado, é boa para o país, isso favorece a estabilidade (
) Infelizmente, alguns pronunciamentos do presidente haviam criado uma tensão desnecessária, gerando, inclusive, uma imagem negativa do pais no exterior, isso é ruim. O Brasil sempre foi uma democracia confiável e, por outro lado, o povo brasileiro sempre foi tido como muito tolerante, muito simpático (
) Essa imagem estava sendo corroída por um discurso hostil. É bom que isso mude.
P: Como o senhor sentiu a presença de militares no governo?
R: Trabalhei no governo, convivi com os ministros militares (
) Não existe nenhuma perspectiva de um ato de um movimento autoritário, de golpe por conta das Forças Armadas (
) A presença de militares no governo, em si, não é necessariamente negativa. O que é equivocado é tentar utilizar essa presença como se houvesse uma posição de força que pudesse se impor sobre os outros poderes. Isso nunca veio das Forças Armadas, e sim de um discurso equivocado do próprio Planalto.
P: O senhor sentiu algum clima de conflito entre as chamadas ala militar e ala Olavista?
R: Em qualquer governo, às vezes se tem um ambiente de intriga entre determinados grupos, e às vezes isso era um pouco exagerado pela imprensa (
) Eu tentava permanecer alheio a essas questões e realizar um trabalho bastante técnico. Tinha uma proximidade com os ministros militares (
) e alguma relação também com os ministros dessa chamada outra ala. Mas sempre me vi mais como um ministro de perfil técnico dentro do governo, assim como o ministro Paulo Guedes.
P: O senhor vê semelhanças entre Bolsonaro e Lula?
R: Ambos têm um caráter um tanto populista na formulação das políticas publicas, com a diferença de que o presidente Bolsonaro seria um populista de direita e Lula, de esquerda (
.) De certa maneira, são dois extremos, na minha opinião respeitosa, que devem ser evitados.
P: O que prejudicou tanto a imagem de Bolsonaro ou do Brasil?
R: Houve alguns equívocos em termos de ações e discursos (
) No passado, parecia que havia um certo estímulo ou desconsideração ante a gravidade dessa supressão da Floresta Amazônica. Já existem ações efetivas do governo nesta linha (Moro cita a operação contra o desmatamento Verde Brasil 2, dirigida por militares). E seria igualmente relevante que elas fossem acompanhadas de uma mudança de discurso do presidente em relação a este tema.
Este tipo de evento acaba prejudicando muito a imagem do país,passando uma imagem do Brasil que é equivocada, de que estamos dentro de um viés autoritário, que somos todos negligentes com o meio ambiente, com os direitos das minorias. E o povo brasileiro não é assim.
P: É possível uma chapa com o ex-ministro da Saúde Henrique Mandetta em 2022?
R: Com a pandemia de COVID-19, os desafios de 2020 são muito grandes para que possamos pensar em 2022, é um cenário absolutamente imprevisível.
Durante a pandemia, Mandetta cresceu muito, porque adotou uma política que passava tranquilidade à população, principalmente por sua transparência (
) Mas acredito que nem ele, nem eu, estamos pensando seriamente em 2022. Vou me direcionar ao setor privado, tenho já bons contatos na área acadêmica, eu já era professor concomitantemente a ser juiz e ministro. Então, a minha tarefa no momento é essa reinserção em 2020 e não pensar em 2022.
Fonte: AFP
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