Órgãos de controle alertam sobre indícios de tortura nos presídios do CE desde 2019 - Veja histórico A Secretaria da Administração Penitenciária considera as últimas 'acusações infundadas' e 'reafirma seu compromisso prático de valorização da pessoa humana em números transparentes e incontestáveis'



Uma das práticas de tortura denunciada pelos detentos é chamada de 'taturana', que consiste em ficar de cabeça para baixo, apoiado com a cabeça no chão

As denúncias de tortura nos presídios cearenses, divulgadas pela Defensoria Pública Geral do Ceará na última semana, corroboram com relatórios emitidos por órgãos de fiscalização do Sistema Penitenciário desde 2019 - início da gestão Mauro Albuquerque na Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização do Ceará (SAP).
Após as últimas denúncias, a SAP emitiu nota em que "considera as acusações infundadas e repudia a tentativa de ataque coordenado contra as políticas de ressocialização em larga escala da população privada de liberdade do Ceará, bem como a forte valorização que a polícia penal cearense tem recebido do Governo do Estado nos últimos anos" e "reafirma seu compromisso prático de valorização da pessoa humana em números transparentes e incontestáveis".
Mauro Albuquerque assumiu a Pasta em janeiro de 2019, com promessa de empregar um regime mais duro nos presídios cearenses e com um histórico de denúncias de torturas na sua gestão no Rio Grande do Norte, onde também foi secretário.
Logo entre fevereiro e março de 2019, o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), ligado ao Governo Federal, realizou visitas a presídios cearenses e encontrou "indícios de práticas de tortura generalizada".
O Conselho Penitenciário do Ceará (Copen), emitiu relatório de inspeção de diversas unidades penitenciárias, em julho de 2019, que pontuou ter se deparado com uma cela, no Centro de Detenção Provisória (CDP), em Aquiraz, "onde a maioria dos internos estão com dedos quebrados, inclusive calcificados, com perda de movimento".
Na Casa de Privação Provisória de Liberdade Agente Penitenciário Elias Alves da Silva (antiga CPPL IV), em Itaitinga, o Copen identificou que 80% dos internos estavam submetidos a um tratamento de "tortura institucional", devido aos maus-tratos, pressão psicológica e falta de oportunidades.
No início da nova gestão penitenciária, o Copen encontrou dificuldades para entrar nos presídios e ter acesso aos presos.


AGREDIDOS OU AGRESSORES - Um episódio ocorrido na Casa de Privação Provisória de Liberdade (CPPL) III, em Itaitinga, em fevereiro de 2019, resultou em duas versões e investigações paralelas.
32 internos afirmaram que foram torturados por policiais penais. Os exames de corpo de delito feito nos detentos apontaram lesões nas mãos, costas e cabeças, que, conforme os presos, teriam sido causados por cassetetes.
O Ministério Público do Ceará (MPCE) e a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD) começaram a investigar a denúncia de tortura. A CGD "identificou o suposto envolvimento de agentes da Força Tarefa de Intervenção Prisional (FTPI) e, por isso, compete ao Ministério Público Federal (MPF) adotar as medidas cabíveis aos fatos".
Na versão dos policiais, os detentos - a maioria chefes de uma facção criminosa paulista - os desobedeceram, ameaçaram e se amotinaram. Após a situação ser controlada, os presos precisaram ser separados e transferidos para outros presídios.
O MPCE denunciou os 32 presos pelos crimes de ameaça, desobediência e motim, em agosto de 2019. A Justiça Estadual recebeu a denúncia e os acusados se tornaram réus, em maio de 2020. O processo segue em tramitação.

NOVAS DENÚNCIAS DE TORTURA - A pandemia de Covid-19 e a necessidade de isolamento social afastaram os órgãos fiscalizadores dos presídios. Após o retorno das visitas e das inspeções, novas denúncias de tortura surgiram no Estado, no fim de 2021.
Uma inspeção realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pela Corregedoria Nacional de Justiça nas 27 unidades prisionais espalhadas pelo Ceará, em novembro daquele ano, indicou irregularidades como a superlotação carcerária e o tratamento "cruel e degradante" aos presos.
Em fevereiro de 2022, surgiram denúncias de maus-tratos e torturas cometidas por policiais penais contra detentos da Penitenciária Industrial Regional do Cariri (PIRC), em Juazeiro do Norte. O caso é investigado pelo Ministério Público do Ceará e acompanhado pela Corregedoria dos Presídios, da Justiça Estadual.
Mais uma vez, a SAP repudiou, em nota, "qualquer ato que atente contra a dignidade humana" e ratificou que "trabalha com transparência e recebe inspeções rotineiras de autoridades do Judiciário, Ministério Público, da Defensoria Pública e até do Conselho Nacional de Justiça".
Em setembro último, a Corregedoria dos Presídios e o MPCE realizaram uma inspeção na Unidade Prisional Professor Olavo Oliveira II (UPPOO II) - antiga IPPOO II - em Itaitinga, e se depararam com indícios de tortura em mais de 70 presos. Os relatos eram de enforcamento, sessões de inalação de gás, pisões na cabeça, entre outras práticas abusivas. Quatro policiais penais acabaram presos, incluindo o diretor da Unidade, no mês de outubro. As investigações do MPCE e da CGD seguem em andamento.
Novas denúncias de tortura levaram a Corregedoria dos Presídios a afastar provisoriamente toda a diretoria (ao total, seis policiais penais) da Unidade Prisional Agente Elias Alves da Silva (UP-IV) - a antiga CPPL IV - também em Itaitinga, no último dia 26 de junho.
Denúncias de que internos da UP-IV sofrem agressões diárias, muitos estão com dedos quebrados, e que há problemas graves na alimentação fornecida (como comida estragada e até um dente encontrado dentro de uma marmita).
Um relatório da Defensoria Pública Geral do Ceará, revelado inicialmente pelo jornal Folha de S. Paulo, apontou mais denúncias de tortura na mesma Unidade: presos reclamaram que são colocados de cabeça para baixo, que têm os testículos apertados e que são baleados com frequência pelos policiais penais.
O Sindicato dos Policiais Penais e Servidores do Sistema Penitenciário do Ceará (Sindppen-CE) emitiu nota pública sobre as denúncias de tortura no Sistema Penitenciário, em que afirma que "é contra essa ação e que acredita na questão da ressocialização".
Isso, porém, não significa defender o crime, a impunidade ou até mesmo questionar os processos empregados de doutrina, com o uso controlado da força, conforme determinado em situações especificas de risco. Seguimos trabalhando pela segurança e humanização, acreditando na construção de um Ceará melhor para todos"

(*)  Defensoria Pública Geral do Ceará
(*) Ministério Público do Estado do Ceará
(*) Reportagem completa no Diário do Nordeste
(*) Folha de São Paulo

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