Os policiais militares consideraram alterar o "raiamento" (característica interna do cano) de uma arma para tentar burlar a perícia no caso em que um adolescente de 15 anos morreu após ser baleado por engano. O caso aconteceu na cidade de São Gonçalo do Amarante, na região metropolitana de Fortaleza, em novembro de 2023. O jovem Pedro Cauã Moreira Ferraz foi assassinado com um tiro quando saía do quintal de casa em busca de cavalo.
O g1 teve acesso a um relatório feito pela Polícia Civil, através da Delegacia de Assuntos Internos, que analisou conversas, em um aplicativo de mensagens, trocadas pelos quatro militares envolvidos no caso, em um grupo criado um dia após a morte do adolescente. Um advogado também fazia parte do grupo — adicionado no dia 12 de dezembro de 2023.
No grupo, os militares se mantinham informados sobre a repercussão do caso. No dia 28 de novembro, um deles falou que a Delegacia de São Gonçalo do Amarante solicitou as armas usadas no caso. Assim, outro policial levantou a possibilidade de alterar uma característica interna da arma para tentar burlar a perícia das armas. "Se desse para mudar a raiação", enviou um dos policiais.
Quando um projétil é disparado, a arma deixa ranhuras na munição. Essas marcas podem ajudar a identificar de qual arma saiu aquela bala. Alterando o raiamento de uma arma, pode-se dificultar a conclusão da análise laboratorial para identificar qual arma utilizada em um disparo.
"A possibilidade que ele ventila seria colocar algum objeto dentro do cano e gerar outras ranhuras, o que a perícia poderia reduzir a capacidade de identificar com máxima certeza de que aquela munição que saiu da arma no laboratório, de fato, é a arma que gerou o disparo original", explicou o perito Marcos Monteiro.
O perito explicou ainda que é possível identificar caso o raiamento de uma arma seja adulterado, pois um microscópio pode mostrar que as ranhuras feitas propositalmente são recentes.
Dois policiais foram denunciados pela morte do adolescente e outros dois por tentativa de homicídio contra os criminosos que estavam sendo seguidos pela equipe. A defesa desses dois últimos disse que não vai se posicionar sobre o caso, uma vez que os clientes não são denunciados pela morte de Pedro Kauã.
Já o advogado Delano Cruz, que representa os dois acusados pela morte do adolescente, alegou que a mensagem enviada no grupo foi tirada de contexto, e que o policial se referia a outro caso. "Na época, nós pedimos que essa análise fosse remetida à Polícia Federal. Lá, foi constatado que não houve alteração nenhuma", disse.
"Nesse processo de São Gonçalo, está provado, através de perícia, que só existe a possibilidade de ter sido usado o fuzil 556 ou uma [pistola] .22. A Polícia só estava usando um; o fuzil 556. O projétil que foi tirado do corpo da vítima, diz-se que é inconclusivo, que não dá para dizer de qual arma saiu aquela munição", complementou.
(*) g1 CE
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