Estrategicamente, Bolsonaro se afasta de Michel Temer



Diferentemente do que sinalizou no início do mês, o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), adotou um distanciamento do presidente Michel Temer (MDB). O afastamento é estratégico, admitem integrantes da equipe de transição. À medida em que evita proximidade com o emedebista, o governo de transição evita participar de decisões que o atual chefe do Palácio do Planalto possa adotar, como o reajuste dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que deve ser sancionado nesta semana. 
Em 7 de novembro, Bolsonaro e Temer se encontraram no Palácio do Planalto. Em pronunciamento à tarde, o pesselista disse que procuraria o emedebista “mais vezes” até o fim do ano para que, juntos, fizessem uma transição “de modo que os projetos de interesse do nosso Brasil continuem fluindo dentro da normalidade”. Foi a última e única vez que se reuniram desde a vitória do presidente eleito nas urnas. Na noite daquela mesma quarta-feira, o Senado aprovou o reajuste dos ministros do STF, que também se estende à procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
O descolamento de Temer protege Bolsonaro da impopularidade da sanção do reajuste. Ou do desgaste com o Judiciário, na hipótese de veto, avalia um integrante do gabinete de transição. “Se tivesse mantido um contato próximo, a interpretação poderia ser outra”, explica. 


Outra pauta que desagrada a equipe do presidente eleito é a Rota 2030, que estabelece um regime tributário especial para o setor automotivo, com incentivos fiscais às montadoras. A matéria foi aprovada em 8 de novembro, no Senado. Como Temer tem 15 dias úteis para sancionar matérias aprovadas no Congresso, o emedebista tem até quarta-feira para ratificar ou vetar a proposta de reajuste ao Judiciário e até quinta-feira para decidir sobre a Rota 2030. 
A postura da equipe política de Bolsonaro não é diferente. O futuro ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), coordenador do gabinete de transição, se reuniu com o atual titular da pasta, Eliseu Padilha (MDB), em 5 de novembro. Uma semana depois do encontro, disse que o governo eleito começa apenas em 1º de janeiro e que o “atual presidente do país tem que cumprir sua missão até 31 de dezembro”.
Na última segunda-feira, havia uma previsão de encontro entre Padilha e o futuro ministro-chefe da Secretaria-Geral, Gustavo Bebianno. A reunião foi cancelada “por problemas de agenda” e não foi remarcada ao longo da semana. Bebianno manifestou o desejo de se reunir nesta semana com o atual titular da pasta, Ronaldo Fonseca, mas ainda não há confirmação.
O distanciamento preventivo de Bolsonaro pode até ser estratégico, mas adia a construção de apoio junto à base no Congresso. É o que avalia o analista político Antônio Augusto, diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Normalmente, um presidente conta com a boa vontade do Legislativo por um período de seis meses, mas, para o especialista, essa “lua de mel” já está valendo. “O relógio está contando. As afinidades das agendas econômicas entre ambos mostram que é um governo de continuidade. Quanto mais projetos aprovar agora, menos dificuldade terá”, avalia.
Aliados de Bolsonaro argumentam que a renovação na Câmara e no Senado dificultam a aprovação de projetos. Antônio ressalta que 244 deputados conseguiram a reeleição e 35 senadores ainda permanecerão na próxima legislatura. “Os dois governos ainda podem se articular para aproveitar a base remanescente de Temer e construir a base de Bolsonaro com os parlamentares remanescentes”, pondera.
Sugestões
A proposta de cessão onerosa (PLC 78/18), que autoriza a Petrobras a transferir a petroleiras privadas até 70% dos direitos da estatal de exploração de petróleo na área do pré-sal, é um tema mais polêmico e pode ser deixado de lado. Mas há outras propostas mais palatáveis que podem ser articuladas conjuntamente, como o PLP 441/17, que dispõe sobre o cadastro positivo.
Há, também, matérias que podem agradar governadores e prefeitos, como o PLP 549/18, que mantém o uso dos coeficientes de distribuição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) do exercício de 2018 para a divisão em 2019, e o PLP 459/17, que dispõe sobre renegociação de direitos tributários à União, estados e municípios. “São pautas que podem fazer afagos aos parlamentares e aproximar Bolsonaro do Congresso”, analisa o cientista político Enrico Ribeiro, coordenador legislativo da Queiroz Assessoria Parlamentar e Sindical.

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Estrategicamente, Bolsonaro se afasta de Michel Temer BLOG DO CARLOS DEHON Rating: 5 segunda-feira, 26 de novembro de 2018

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