Um mês é muito tempo na política global.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, está novamente na China. Mas, nesta ocasião, é diferente.
Pela primeira vez desde a invasão da Ucrânia, Putin visita seu principal aliado, não como um vassalo do presidente da China, Xi Jinping, depois de ter sido encurralado pelas sanções econômicas do Ocidente.
Putin passou a ser um líder mundial, que fala de igual para igual com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, líder do país mais rico e do maior exército do planeta — ou seja, o principal rival da China.
A visita à China é uma vitória para Putin, depois da sua reunião de cúpula no último dia 15 de agosto, quando Trump o recebeu no Alasca de forma cerimoniosa, dando a ele as boas-vindas em solo americano.
Putin convenceu o presidente americano a não pedir novamente a suspensão dos bombardeios na Ucrânia e abandonar suas ameaças de aplicar novas sanções à Rússia.
Na China, Putin tem uma grande festa de boas-vindas. Mais de uma dezena de líderes regionais se reúnem na cidade de Tianjin, no norte do país, para uma cúpula de dois dias da Organização para a Cooperação de Xangai (SCO, na sigla em inglês).
Deste grupo, fazem parte o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un (nada alheio às críticas ao Ocidente) e o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, cujas relações com Washington e Pequim são muito mais complexas.
Mas este é apenas o começo.
Na quarta-feira (3/9), em Pequim, eles irão assistir a um desfile militar para comemorar o 80° aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e "a vitória do povo chinês na resistência à agressão japonesa e na guerra contra o fascismo".
Seriam estes dois eventos um sinal de fortalecimento de uma aliança global contra os Estados Unidos?
E este bloco Rússia-Índia-China (RIC) — um grupo poderoso que tem como objetivo contrabalançar o domínio ocidental no cenário internacional, mas que ficou inativo nos últimos cinco anos — estaria sendo reativado, em um momento de intensificação da guerra comercial empreendida por Donald Trump?
Mais unidos
Diversos especialistas indicam que esta visita incomumente longa de Putin à China tem como objetivo demonstrar ao Ocidente que a "grande amizade" entre Pequim e Moscou está cada dia mais forte.
E que a intenção dos Estados Unidos de enfrentar os dois governos não será bem sucedida.
Os analistas destacam ainda que, mesmo se Trump entregar a Ucrânia para a Rússia e levantar as sanções, Moscou não irá se afastar da China.
Eles destacam que o ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger (1923-2023) conseguiu tirar a China da esfera de influência da União Soviética nos anos 1970, durante o mandato do presidente americano Richard Nixon (1913-1994).
Mas, naquela época, as relações entre Pequim e Moscou eram tensas. Agora, as coisas são diferentes.
"Ao aumentar a pressão comercial sobre Pequim, o governo Trump só fortalece o eixo China-Rússia", explica o ex-diplomata Pierre Andrieu, especialista nas relações entre a China e a Rússia do Instituto de Políticas da Sociedade Asiática.
"E as tentativas de debilitar os vínculos entre os dois países, como fez Kissinger anos atrás, não produziram resultados tangíveis", declarou ele à BBC.
"Se a estratégia americana de atingir este distanciamento for levantar as sanções contra Moscou ou pôr fim à guerra na Ucrânia, é porque Washington menospreza a complexidade desta associação", destacou um analista anônimo, especialista nas relações entre a China e a Rússia, em um artigo publicado no portal do Centro de Análises de Políticas Europeias.