Volta do Ministério do Trabalho incomoda e sinaliza perda de poder de Guedes

Reprodução/Flickr/Governo de Transição
Onyx Lorenzoni e Paulo Guedes


O anúncio de que o governo Bolsonaro iria recriar o Ministério do Trabalho pegou não só especialistas e Congresso de surpresa, como também membros do alto escalão do governo federal. Embora a recriação de ministérios fosse esperada, nem os mais audaciosos podiam prever a divisão no Ministério da Economia, pasta de Paulo Guedes, a quem foi prometido total autonomia, sem interferência direta do Palácio do Planalto.

A pressão do Congresso Nacional sobre Guedes, no entanto, iniciada nas discussões sobre emendas parlamentares no Orçamento 2021, ascendeu o alerta na sede do ministério, principalmente após reunião entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (Progressistas-AL), em que foi pedida a volta dos ministérios do Trabalho e Indústria. Para conseguir aprovar pautas do governo, era necessário ceder as vontades do bloco político criticado ferrenhamente por Bolsonaro nas eleições de 2018, o hoje pilar do governo Centrão.

Em entrevista à rádio Banda B, de Curitiba (PR), Jair Bolsonaro disse que a divisão do Ministério da Economia dará 'certa descompressão' a Paulo Guedes.

"Dá uma certa descompressão no Paulo Guedes e deixa o Onyx Lorenzoni tratar dessa questão importantíssima que precisamos, sim, além de recuperar empregos, é buscar mais alternativas para atender os desassistidos", disse.

Entretanto, internamente é clara que a decisão foi vista como manobra de apoio político, o que enfraquece as decisões de Guedes e diretamente tira poder do outrora 'superministro'.

"Considerando que ele [Guedes] tinha uma enorme concentração de poder, ele acaba objetivamente perdendo o poder político. Outra questão é a perda de orçamento e na área pública ter orçamento significa recurso, fazer política pública, e é muito provável que, por exemplo, recursos do FAT, que financia obras volumosas e políticas públicas, venham a sair do ministério e passem a ser gerenciados pelo Onyx Lorenzoni. Seja pelo lado político ou recursos econômicos, Guedes perderá poder", afirma Eduardo Grin, cientista político da FGV EAESP.

Fontes ligadas ao ministro da Economia informaram ao iG que Guedes condicionou a recriação da pasta do Trabalho às aprovações das reformas administrativa e tributária no Senado. As negociações devem ser repassadas para Ciro Nogueira, novo ministro-chefe da Casa Civil.

"A participação do Centrão no Governo é para fortalecer a posição política do Bolsonaro. O Guedes vai perder seu poder, mas não a importância. Para o Planalto, ele é uma figura estabilizadora e que atrai o investimento externo e dá perspectiva positiva para investidores. A entrada de partidos no governo visa melhorar o que Guedes não teve, a articulação política. Embora o ministro tenha boa influência na Câmara, a situação de Guedes no Senado é bem complicada", explica Rodrigo Araújo, coordenador do curso de ciências econômicas do Ibmec-SP.

A preocupação de Guedes é que há forte apoio da Câmara dos Deputados às propostas apresentadas, mas os textos poderão travar no Senado, onde o ministro tem menos trânsito. Outro fator preocupante para a tramitação do texto entre os senadores é o possível afastamento entre Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e Jair Bolsonaro. As falas antidemocráticas do presidente nas últimas semanas sobre a possibilidade de não haver eleições em 2022 caso não seja aprovado o voto impresso foram mal recebidas por Congressistas. A situação fica ainda pior quando a ala política aliada a Bolsonaro ressalta a possibilidade de Pacheco se candidatar à presidência da República, ou seja, ameaça ao atual mandatário do Brasil.
De carta-branca a divisão da pasta

Economista renomado no país, Paulo Guedes se tornou ministro de Bolsonaro antes mesmo das eleições de 2018. Durante as negociações para a candidatura, Jair Bolsonaro via em Guedes seu fiel escudeiro quando o assunto é economia, tanto que ressaltou a carta-branca ao ministro, chamado de 'Posto Ipiranga' e encarado como um 'superministro'.

Eleito, Bolsonaro juntou quatro ministérios e repassou o comando a Guedes. Além do Ministério da Fazenda, Trabalho, Indústria e Planejamento faziam parte do super-ministério.

Com promessa de agenda liberal, Paulo Guedes passou a estudar reformas estruturantes que, segundo especialistas, se faziam e se fazem necessárias no país. No entanto, as alterações tributárias e administrativas ficaram estacionadas em 2020, devido às urgências de gastos com a pandemia e a falta de habilidade política do governo, constantemente em crise.

Ainda no ano passado, Paulo Guedes começou a ver que sua prometida carta-branca passou a ser diminuída. A necessidade de apoio a pautas ideológicas e outras agendas do governo federal fizeram o Palácio de Planalto se aliar ao Centrão, bloco de partidos criticado por Bolsonaro na campanha eleitoral e no primeiro ano de mandato.

"A perda de poder dele se deve ao fato de passarmos dois anos e meio, indo para o final do terceiro ano de mandato, e ele não conseguiu entregar nada que ele prometeu durante a campanha. Ele queria privatizar as estatais até agora que nós temos, é esse fiasco da Eletrobras. Prometeu que iria zerar o déficit público e até agora não há nenhum sinal. Reforma administrativa, no sentido de reorganizar sobretudo as relações de trabalho dos servidores públicos. Nada foi feito. A reforma tributária é essa confusão que ninguém sabe onde vai dar", diz o professor da FGV.

IG

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