Mortalidade em massa de insetos ocorreu há 120 milhões de anos na Bacia do Araripe, aponta pesquisa

Mais uma grande descoberta a partir da Bacia do Araripe, na região do Cariri, foi publicada, nesta sexta-feira (26), por pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), da Universidade Regional do Cariri (Urca) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O estudo aponta para um evento de mortalidade em massa de larvas insetos aquáticos há cerca de 120 milhões de anos. Isso pode indicar os impactos de mudanças climáticas durante o período Cretáceo Inferior.
A pesquisa se iniciou a partir das primeiras escavações, entre 2017 e 2018, na Formação Crato, no município de Nova Olinda. O trabalho foi realizado pelo Laboratório de Paleontologia da Urca.

“Foi um trabalho exaustivo e levou mais um ano para analisar camada por camada. Algo que foi realizado pela primeira vez nesse importante depósito fossilífero e contou com o esforço e dedicação de uma grande equipe de professores e estudantes”, afirma o professor e paleontólogo Álamo Feitosa.

O achado

Durante o Cretáceo Inferior, entre 113 e 125 milhões de anos atrás, a África e América do Sul ainda estavam unidas, formando um único continente conhecido como Gondwana. Mas os blocos de terra já começavam a se separar, formando um oceano estreito e raso. À beira deste oceano, havia um ambiente composto por lagoas com vida animal e vegetal diversificada. Este ambiente se preservou como uma unidade fossilífera que conhecemos hoje como Formação Crato.

O achado provém de uma camada de calcário laminado, localmente conhecido como pedra cariri, dentro da Formação Crato. As larvas de insetos encontradas pertencem ao grupo Ephemeroptera, conhecidos popularmente como efêmeras.

“Essa localidade é muito rica em fósseis e, portanto, pequenos acúmulos de mais de três insetos próximos na mesma camada de rochas são comuns nesta unidade, mas acumulações de 40 insetos, como as apresentadas nesse estudo inédito, são muito raras no registro fóssil", detalha a pesquisadora Arianny Storari, da Ufes.

Motivo da mortandade pode ter sido o aumento da salinidade

Ao analisar a camada de mortalidade, os pesquisadores notaram que as larvas e os peixes eram menores do que o normal. Isso os levou à hipótese que eles poderiam estar vivendo em uma coluna de água rasa, porque indivíduos mais jovens poderiam suportar níveis de água mais baixos devido ao seu tamanho pequeno.

“Com base nos padrões anatômicos e de preservação das larvas das efêmeras da família Hexagenitidae e dos peixes do gênero Dastilbe, foi possível compreender mais ainda o ambiente pretérito da Formação Crato”, afirma a paleontóloga Taissa Rodrigues, da Ufes.

Todos os organismos aquáticos na camada de mortalidade estudada também exibiram excelente preservação e não apresentaram nenhum tipo de orientação no sedimento. Isso indica que morreram no mesmo local que viveram. A anatomia das larvas da família Hexagenitidae demonstra que elas viviam em águas calmas e mais paradas.

Além dos fósseis, os pesquisadores identificaram cristais de halita, um mineral que se forma pela precipitação de sal, em camadas próximas ao nível de mortalidade. Isso pode apontar que estes organismos podem ter morrido por um aumento de salinidade. “Este aumento teria ocorrido devido à diminuição do espelho d'água”, afirma Renan Bantim, paleontólogo da Urca.

As espécies viventes de efêmeras geralmente não toleram concentrações elevadas de sal, como em águas salobras. Por conta disso, o aumento da salinidade pode ter sido o causador da mortalidade em massa dos insetos, mas não necessariamente dos peixes, que foram encontrados em camadas distintas.

Importância da descoberta

O professor Álamo Feitosa acredita que este estudo é extremamente relevante, pois, é a primeira vez que se faz a descoberta de mortandade em massa de insetos, especificamente aquáticos. “Isso mostra que houve uma variação abrupta de temperatura e salinidade nesse lago que formava a região. Isso culminou na quantidade de aumento insetos mortos”, explica o paleontólogo.

Além disso, pelo aumento de salinidade neste lago, acredita que ele estava conectado a um braço do mar e que, numa maré alta, a água salgada pode ter invadido o lago. “Numa época quente, a quantidade de oxigênio dissolvido diminui muito. Isso causava as mortes”, detalha.

A pesquisa também pode ajudar a interpretar tendências recentes e até futuras, como o aquecimento global.

“Esse estudo mostra como eventualmente, nós, que estamos vivendo um início de aquecimento global, poderemos passar por mortandades, seja em água doce, salgada e até mesmo em ambiente terrestre”, completa Feitosa.

Além disso, segundo a professora da UFPE Flaviana Lima, que também participou da escavação que culminou neste achado, como os fósseis de efêmeras de Hexagenitidae e os peixes Dastilbe representam uma fauna que viveu no paleolago da Formação Crato, os dados deles podem ser usados para entender melhor o contexto paleoambiental desta unidade.

“Assim como nos dias de hoje os insetos aquáticos são ótimos bioindicadores de qualidade de água, eles também conseguem nos ajudar a entender o ambiente pretérito, já que são sensíveis às variações do meio onde vivem”, complementa Storari.

Fonte: Diário do Nordeste


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